sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Uma sala vermelha e um quadro perfeito






Da confissão
O sentido de voto do meu corpo é agora tutelado por uma entidade externa, um outro corpo  adicionado ao meu.

Da pertença
A tua biblioteca com os olhos postos em mim desde que entrei na tua sala, os teus livros a dizerem entre si que nunca me tinham visto
(quem é aquela?)
a prenderem a respiração ao meu toque como se tu fosses o seu único digno proprietário e eu 
(uma pequena invasora) 
uma pequena invasora que os agarra docemente com as ponta dos dedos
 à laia de carícia; alguém feito de carne, pele, ossos e unhas que lhes abre as folhas para os saber por dentro.

Do Martírio
Explicar ao meu corpo que se podia acalmar e que sobreviveria sem ti se um dia o teu quarto cor de fruta desaparecesse da nossa frente para sempre e os teus olhos nunca tivessem existido
(o medo dos teus olhos a questionarem os meus)

Do sofá preto que fala
Explicar as saudades e a dor no peito. Explicar o verniz ruído na ponta das unhas. Explicar os armários azuis-escuros da tua cozinha. Explicar o teu quadro e aquilo que ele me disse enquanto cozinhavas.  












Da galinha doce no meu prato


A galinha morta no meu prato a dizer-se doce ao lado do arroz: cozinhaste-nos aos três enquanto a minha roupa me vestia.
Porque gostava de te ter dito que Deus anda a tentar abordar-te na tua solidão, que ele existe, que não é a brincar. Gostava de te ter dito que ele deve andar a esgueirar-se por detrás das portas do teu T1 Kafkiano, a olhar-te, quieto e tranquilo, observando-te nos teus dias como quem te espera. Gostava de saber esperar por ti. Gostava de ter-te explicado Deus quando íamos no teu carro e o painel eletrónico marcava 111 km/Hora. 

(111)
(111,  quase uma emergência)
Gostava que gostasses de mim a sério.
 Gostava que sim.


Adeus, Ophelia

  Querida Ophelia,  a tua morte foi a coisa mais difícil que vivi até hoje. Ter ficado contigo até ao último minuto dá-me um certo alento es...